Por que tanta resistência à acessibilidade?

Tenho conversado com alguns empresários sobre a implantação da acessibilidade em seus estabelecimentos, para saber mesmo qual visão essas pessoas têm a respeito e confesso que, no geral, tem sido bem frustrante. Frustrante em vários sentidos, mas principalmente na resistência à essas adequações.

Principais fatores

Quando falamos em resistência à acessibilidade, o custo, para o empresário, é um dos principais impeditivos práticos, na verdade eles nem sabem direito o que precisaria ser feito, mas, de cara, já encaram qualquer adequação como gasto e não como investimento. Então o que eu percebo é que existe uma enorme falta de informação nesse sentido, não só na questão técnica e legal, mas principalmente no que a acessibilidade de fato representa na vida das pessoas com deficiência e mobilidade reduzida.

E será que a grande maioria das pessoas, sejam empresárias ou não, conhece os conceitos básicos de acessibilidade? Será que elas sabem o que é uma pessoa com mobilidade reduzida ou mesmo quais os tipos mais comuns de deficiências que existem? Estamos falando de 45,6 milhões de pessoas ou 24% da população brasileira com algum tipo de deficiência, segundo o último Censo do IBGE, ou seja, uma parcela gigantesca da população que tem seus direitos garantidos por lei, entre eles, o de ir e vir com autonomia e segurança. Confira mais sobre esse assunto no post Censo IBGE: pessoas com deficiência.

Acesso à informação

Então como todas essas informações deveriam chegar às pessoas? Quem são os responsáveis pela falta de acessibilidade nos espaços de uso comum? A culpa é do arquiteto, que não a contemplou no projeto? Ou é do empresário, que nem cogitou essa possibilidade? Ou ainda da prefeitura, que não fez a fiscalização como deveria, deixando todos os envolvidos bem à vontade para não se importarem, já que nem o poder público cobra tais exigências legais? De quem é a responsabilidade? Quem pode e deve cobrá-la?

Todos os envolvidos têm a sua parcela de responsabilidade, afinal estamos falando de diferentes esferas da sociedade que deveriam atuar juntas por esta causa, mas, no fim, são as pessoas com deficiência e mobilidade reduzida que sofrem na pele as consequências de tanto descaso, seja ao não conseguirem entrar, circular ou usufruir dos espaços coletivos, como lojas, bares, restaurantes, academias, escolas, clínicas e por aí vai, ou mesmo pelo despreparo de quem não está minimamente capacitado para atendê-las.

Direitos e deveres

A principal Lei de Acessibilidade no Brasil é a Lei nº 10.098, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação. Essa lei exige a acessibilidade para as pessoas com deficiência em todos os estabelecimentos, sejam eles espaços públicos ou privados, inclusive nos ambientes digitais. Mas existem ainda outras diversas leis, decretos, convenções e portarias em vigor no Brasil, confira a legislação de acessibilidade.

O Ministério Público Federal e as Secretarias da Pessoa com Deficiência fiscalizam em todo o país, através de de suas unidades estaduais e municipais, o cumprimento das leis e normas técnicas vigentes de acessibilidade. Denúncias e reclamações podem ser feitas de forma anônima e caso qualquer cidadão se sinta desrespeitado, basta buscar o site do Ministério Público do seu estado ou mesmo a prefeitura do seu município para maiores informações.

No caso de denúncia ou mesmo fiscalização, tanto o proprietário do estabelecimento como o responsável técnico pelo projeto arquitetônico ou obra, podem responder judicialmente pelo não cumprimento das leis de acessibilidade e a situação ainda pode se agravar caso ocorra algum acidente envolvendo um usuário. Além dos danos materiais e morais, o Estado ainda pode punir os estabelecimentos com suspensão temporária de atividade, cassação de licença ou de atividade, interdição total ou parcial de estabelecimento, obra ou atividade, entre outras.

Percebe como esse assunto é sério? Estamos falando de intervenções obrigatórias e não opcionais! A acessibilidade é um direito garantido por lei federal e sua implantação precisa ser respeitada de uma vez por todas.

Por onde começar

A educação é a chave para que possamos informar, sensibilizar e capacitar as pessoas para a viabilização da acessibilidade em suas diversas esferas de atuação. Ela deve ser prevista na concepção dos projetos, não apenas nos arquitetônicos, mas em todos aqueles onde as atividades humanas forem contempladas e devem contar com o envolvimento de todos os participantes, então deixo aqui o meu humilde recado:

Arquitetos e engenheiros, nunca abram mão da acessibilidade em seus projetos e obras, ela precisa ser 100% implantada de modo a garantir atendimento a todos os usuários, sem restrições. Conversem com seus clientes e não deixem alternativas, pois vocês, na condição de responsável técnico, poderão responder judicialmente caso ocorra alguma intercorrência futura.
Proprietários de estabelecimentos abertos ao público, passem a enxergar a acessibilidade como uma aliada e um diferencial de negócio, já que você abrirá as suas portas a um grupo da população que sempre foi excluído e que, por essa razão, saberá valorizar o seu reconhecimento. Não corra riscos desnecessários de manchar a credibilidade do seu negócio, esse é um investimento que precisa ser contabilizado, assim como vários outros da sua empresa.
E, finalmente, clientes e usuários, fidelizem estabelecimentos que tratem todas as pessoas de forma igualitária, que permitem que seus amigos ou familiares com deficiência ou mobilidade reduzida também possam usufruir com autonomia (ou seja, sem auxílio) dos mesmos espaços que você. Cobrem a acessibilidade nesses locais!